segunda-feira, outubro 12, 2009

Rescaldo eleitoral

Admito, com bastante pesar, que cada vez menos me regozijo com quaisquer vitórias ou derrotas de partidos ou de líderes políticos, visto que o ancestral e famigerado pessimismo português acabou por também me contagiar.
Ao fim de mais de três décadas em que dois partidos foram disputando e conquistando a liderança sem que nada de verdadeiramente positivo, inovador ou lucrativo se verificasse, desejava agora poder vislumbrar alternativas consentâneas com as nossas reais necessidades
e actuações credíveis e eficazes. Acima de tudo, gostava de voltar a acreditar na integridade e competência de um qualquer líder político, o que nunca me aconteceu na idade adulta.
Tinha duas tranças gordas e sardas no nariz quando os meus pais choraram a morte de Francisco Sá Carneiro, que mitifiquei como o D. Sebastião da era moderna. De então para cá, quanto mais penetro nos meandros da política nacional, mais defraudada me sinto. Ocorre-me mesmo perguntar: para quando a importação de políticos à altura do buraco em que não paramos de nos afundar? Entretanto, uma das coisas que mais me chocou foi ter finalmente constatado que a política e o futebol têm muito mais em comum do que seria de esperar. Senão vejamos: os políticos mudam de partido ou transformam-se pomposamente em independentes consoante os seus interesses e os benefícios que tal lhes acarreta; as multidões entram em delírio pelas vitórias dos seus partidos ou dos seus líderes e andam à batatada quando a coisa dá para o torto; os políticos prostituem-se durante as campanhas para arrebanhar as massas e nem a gripe A os demove de beijar e abraçar as turbas delirantes (imagino o quanto gastaram este ano nos mais variados e potentes desinfectantes!); os humoristas tiram partido do circo que se instala e copiam modelos televisivos já batidos noutros países para se auto-promoverem e facturarem dinherinho e audiências, contando com a adesão dos palhacinhos que encontram margem de manobra para a campanha gratuita junto dos que já não movem o traseiro para sair à rua em explosões de histeria colectiva; o dinheiro corre a rodos e escoa-se em ralos invisíveis e duvidosos, esquecendo aqueles que apelam à nossa contenção o que estas quantias poderiam fazer em prol da tão famigerada e aludida crise (campanhas e idas às urnas a duplicar num tão curto espaço de tempo é surreal!); e quando chega a hora da verdade, a única coisa que vemos são indivíduos a congratular-se da vitória, a inventar a vitória, a obviar a derrota com argumentos falaciosos, a antever as próximas vitórias. Irra! Mas a vitória de quem e do quê, num país que não pára de se atolar? (Lembra aquela música "Ai Portugal está podre de rico/ Ai compra tudo até sarro de penico") O meu clube é melhor do que o teu? O meu dirigente ganhou e o teu perdeu? Ora bolas pró pagode! O circo romano era mais genuíno e os déspotas sequiosos de poder não vestiam a pele de cordeiros.
Não vislumbro, infelizmente, nenhuma luz ao fundo do túnel. Se não respeitasse aquilo que acredito ser um direito e um dever cívico de todos nós, não daria dois passos para introduzir a medo o meu boletim de voto na urna. E assisto à noite eleitoral para me irritar de grande e ficar ainda mais triste e desalentada e com menos vontade de arregaçar as mangas e dar o meu contributo para o benefício colectivo comparecendo no meu local de trabalho.
Houve apenas alguns momentos fugazes a contrariar o meu desânimo na noite passada: a derrota de Fátima Plastificada no Brasil Graças ao Saco Azul Felgueiras e de Paulo Casa Pia Esquecida Pedófilo Pedroso, este último apoiado por Jorge Sampaio e atacado por uns senhores com muito sentido de humor que preconizavam a sua castração química; a derrota de Pedro Sanguessuga Lopes, também conhecido a partir de ontem por Vaivém Espacial graças às suas aflitas peregrinações de cá para lá e de lá para cá enquanto prometia ir a Fátima de joelhos se o milagre das freguesias por apurar lhe valesse; a derrota de Paulo Catherine Deneuve Portas, o senhor que insuflou nas legislativas e que, apesar de ter feito alianças com Deus e com o Diabo, acabou por só conquistar uma câmara, o que ainda assim não lhe retirou fôlego para se vangloriar do seu partido ter subido um por cento nestas autárquicas! Em suma, consolei-me com o mal, pois não vislumbrei nada de bom.

Não resistindo a puxar a brasa à minha sardinha, houve apenas um indivíduo cujo discurso na noite das legislativas me trouxe um sorriso rasgado aos lábios, apesar de não estar aqui a fazer a sua apologia e de acreditar que, enquanto mestre da mesma arte, este não poderia ficar indiferente ao sucedido. Foi aquele que disse: "Esta noite, Maria de Lurdes Rodrigues perdeu. Dou os parabéns aos professores, que ganharam em nome da Educação." Que as palavras de Francisco Louçã sejam proféticas é o que eu desejo, pois com a Sra. Sinistra no comando será difícil continuar a ter alento. E desejo igualmente que o Sr. José Pinóquio Sócrates mantenha a sua palavra e cumpra a promessa, que hoje fez aos portugueses, de que a sua actuação política será mais dialogante. Repare-se que apenas Paulo Portas, o mago das alianças, concedeu a extraordinária vitória nas autárquicas aos socialistas.
Parafraseando "o sexo e a Cidália", só me ocorre este último pensamento: Oh God, make me good, but not yet!

(imagem de Alessandro Pautasso)

2 comentários:

Jorge disse...

Em completa sintonia contigo, amiga.
Só estou pessimista no que respeita à anunciada vitória dos professores. Temo que a educação constitua moeda de troca (para deixar cair, pois então) numa eventual negociação de "governabilidade", qualquer que seja a força política. Gato escaldado...

Beijocas

Kika disse...

Concordo em absoluto contigo, mas sabes também, por experiência própria, que se não houver um certo optimismo, o dia-a-dia torna-se muito penoso. Acho que todos os políticos perceberam inequivocamente que somos um eleitorado de peso, o que talvez reverta a nosso favor.

Bjocas e boa semana*